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HarperCollins 200 anos. Desde 1817.

 

Editado por Harlequin Ibérica.

Uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.

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28001 Madrid

 

© 1994 Miranda Lee

© 2017 Harlequin Ibérica, uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.

Desejo e traição, n.º 1070 - junho 2017

Título original: Desire and Deception

Publicado originalmente por Mills & Boon®, Ltd., Londres.

 

Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor, incluindo os de reprodução, total ou parcial.

Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Books S.A.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, carateres, lugares e situações são produto da imaginação do autor ou são utilizados ficticiamente, e qualquer semelhança com pessoas, vivas ou mortas, estabelecimentos de negócios (comerciais), feitos ou situações são pura coincidência.

® Harlequin, Sabrina e logótipo Harlequin são marcas registadas propriedades de Harlequin Enterprises Limited.

® e ™ são marcas registadas por Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença.

As marcas em que aparece ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

Imagem de portada utilizada com a permissão de Harlequin Enterprises Limited.

Todos os direitos estão reservados.

 

I.S.B.N.: 978-84-687-9828-8

 

Conversão ebook: MT Color & Diseño, S.L.

Sumário

 

Página de título

Créditos

Sumário

Capítulo 1

Capítulo 2

Capítulo 3

Capítulo 4

Capítulo 5

Capítulo 6

Capítulo 7

Capítulo 8

Capítulo 9

Capítulo 10

Capítulo 11

Capítulo 12

Capítulo 13

Capítulo 14

Capítulo 15

Se gostou deste livro…

Capítulo 1

 

Jade acordou. Era de dia e estava confusa. «Onde estou?», perguntou-se. Os comprimidos para dormir tinham-na deixado aturdida.

Então, lembrou-se. Estava no seu quarto de Belleview. Em casa.

– Oh, Deus – gemeu e saiu da cama, apertando as têmporas enquanto percorria nua o tapete branco para chegar à casa de banho do quarto.

– Oh, Deus – repetiu ao ver o seu reflexo no espelho. Tinha o cabelo, curto e loiro, despenteado, e os seus olhos azuis-escuros pareciam dois buracos pretos sobre o pálido rosto.

Mas o que mais lhe chamou a atenção foi ver que tinha os seios arroxeados. Não se apercebera…

Jade observou-os antes de começar a tremer violentamente. De repente, deu-se conta do horror de que fugira e deixou-se cair num canto da casa de banho, pôs a cabeça entre as pernas e sentiu náuseas. Durante alguns segundos, a divisão andou às voltas, mas depois parou. Levantou a cabeça a pouco e pouco. Como ainda se sentia suada, decidiu ficar ali sentada mais um pouco.

No entanto, não deixava de pensar. Estava aflita, os seus pensamentos eram de recriminação.

Não devia ter permitido que Roberto ficasse no quarto de hóspedes da sua casa enquanto procurava um lugar onde viver. E nunca devia ter acedido a que desse aquela pequena festa na noite anterior.

Mas, na verdade, não vira nenhum perigo. Afinal de contas, Roberto era gay. Tal como os seus amigos. Jade sempre achara que os homens homossexuais eram não só doces, como também amáveis, educados e muito interessantes. Eram bons amigos para as mulheres. Amigos seguros.

Mas um dos amigos de Roberto não fora assim.

Levantou-se bruscamente e foi para o duche. Debaixo do jorro, fechou os olhos e levantou a cara para cima, fechando a sua mente a tudo o que não fosse aquele calor que a limpava e a fazia reviver.

Era um truque que aprendera há muito tempo. Quando se sentia demasiado magoada, desligava e concentrava-se apenas nas suas necessidades mais básicas: lavar-se, comer, dormir.

Porém, pela primeira vez, não funcionou. Não conseguia esquecer como lhe pusera a mão na boca, como lhe apertara o peito com aquele braço de aço e lhe sussurrara aquelas palavras horríveis ao ouvido. Se não lhe tivesse dado aquele pontapé no sexo, só Deus sabia o que podia ter acontecido.

Mas conseguira escapar. Depois, pegara nas chaves do carro que estavam na mesa do corredor e fora para a porta vestida apenas com aquela camisa de dormir de seda. Conduzira até Belleview a toda a velocidade e chegara às três da madrugada, hora em que as ruas dos subúrbios de Sidney estavam praticamente desertas. Felizmente, a polícia não a parara. Não sabia o que teria acontecido se a tivessem detido por condução perigosa e a tivessem levado, seminua, para a esquadra. Provavelmente, Nathan teria aparecido, zangado e com o advogado. Como da última vez.

Embora da última vez a tivessem detido por posse de drogas. Zachary Marsden também a defendera nesse caso.

No entanto, a marijuana que tinham encontrado no porta-luvas do seu carro não era sua. Ela odiava drogas. Pertencia a uma suposta amiga que jurara que parara de consumir drogas. Felizmente, Zachary era um óptimo advogado e provara a sua inocência rapidamente. Além disso, Zachary acreditara na sua inocência, que era mais do que podia dizer de Nathan.

O seu irmão adoptado era um hipócrita!

Pretendia ser moralmente superior aos outros, como o seu pai. Mas ela sabia ao que se dedicara antes de Byron o ter tirado da rua. Mesmo assim, achava ter direito a julgá-la por ter uma vida supostamente louca e a criticá-la por ser provocadora.

Jade achava-o ridículo, já que Nathan irradiava sexo. Não havia mulher a menos de quinze metros que não se sentisse atraída por ele, incluindo a sua própria mãe.

A mente de Jade concentrou-se imediatamente na sua mãe. Na sua opinião, nunca tivera mãe. Final da história.

De volta a Nathan.

Fechou o duche e sorriu com amargura. Era um demónio de sangue-frio. Todos sentiam pena dele porque se supunha que tivera uma infância muito desventurada. Mas ela, não. Nada disso. Nathan adorara cada minuto da sua existência decadente com a louca da sua mãe.

Sim, Nathan era um homem duro e oportunista, que enganara Byron para que o adoptasse, garantindo um bom nível de vida e um emprego maravilhoso, que nunca conseguiria ter tido de outro modo com a sua péssima educação. As pessoas diziam que era inteligente, e talvez fosse, pois nem toda a gente seria capaz de escrever peças de teatro de sucesso no seu tempo livre. Mas Nathan nem sequer tinha um bacharelato, muito menos uma carreira universitária, que fora o que o seu pai lhe dissera a ela que devia ter antes de poder pôr um pé na Whitmore Opals.

A habilidade de Nathan consistia em analisar as pessoas e tirar partido das suas fraquezas.

O pobre Byron acreditara em Nathan desde o começo e fechara os olhos a tudo o que dizia respeito à sua moral. Era uma pena que não os tivesse mantido bem abertos para ver o que acontecera na sua própria casa desde que levara aquele símbolo fálico andante para Belleview.

Mas, não, Byron não se apercebera de nada, talvez porque não passava muito tempo em casa. O director da Whitmore Opals era um viciado no trabalho que descuidara da sua família, excepto quando tinha algum arrebatamento de autoritarismo. Não fazia ideia de como eram nem de como se sentiam. Mesmo no que dizia respeito ao casamento de Nathan, Byron culpava Lenore de tudo, do casamento repentino porque engravidara, ao inevitável divórcio. Sim, Byron estava cego no que dizia respeito a Nathan.

Mas era compreensível. Nathan era capaz de cativar qualquer pessoa. Ela mesma o adorara durante anos. Considerara-o o seu herói. Amara-o.

E pensara que ele também gostava dela. Mas o que Nathan gostara fora de se aproveitar da sua adoração inofensiva, da adoração de uma menina. Quando se tornara uma adulta, com as necessidades e desejos de qualquer mulher, virara-lhe as costas. Não porque não a desejasse. Jade sabia que a desejava. Nathan tivera de usar toda a sua força de vontade para não fazer amor com ela uma tarde, alguns meses antes. Mas conseguira controlar-se, porque uma aventura com ela teria posto em perigo o que mais desejava naquele mundo: Whitmore Opals. A fortuna dos Whitmore.

Dado que Jade era a única filha natural de Byron e, para rematar, do sexo feminino, Nathan devia pensar que poderia herdar pelo menos o controlo da empresa. Byron era um machista de primeira categoria, que pensava que o lugar de uma mulher era em casa, nunca na administração de uma empresa. As suas discussões com mulheres como Celeste Campbell eram intermináveis.

Jade admirava em segredo a directora das Jóias Campbell. Era uma mulher atrevida e bonita, atrevida na sua vida privada. E então? Se fosse um homem, ninguém a criticaria. Mas era uma mulher e toda a gente censurava que saísse com homens mais jovens do que ela.

Uma vez, Nathan dissera que ela mesma estava em perigo de se tornar como ela, recordou, torcendo-se por dentro, de se tornar uma prostituta. Não era verdade! Podia contar os homens com quem estivera com os dedos de uma mão.

Agarrou numa toalha, zangada, indignada, mas quando começou a limpar-se vigorosamente doeram-lhe os seios. Olhou para baixo e não conseguiu evitar as lágrimas.

Demorou algum tempo a sentir-se suficientemente calma para deixar o seu quarto e enfrentar a sua família.

Enquanto descia as enormes escadas, pensou que estava demasiado silêncio. Onde estariam todos? Suspirando, dirigiu-se para a cozinha, onde certamente encontraria Melanie.

E não se enganou, a eficiente governanta de Belleview estava a pôr roupa na máquina de lavar roupa. O seu rosto era tão severo como sempre e parecia um pouco deslocado naquela cozinha branca, recém-reformada. Na verdade, era fácil imaginar Melanie, com o cabelo preso num coque e aquele vestido preto como a governanta de uma novela gótica.

Melanie ergueu-se, virou-se e olhou para ela.

– Olá, Jade – cumprimentou-a com a sua voz inexpressiva. – Estacionei o teu carro na garagem. Parece que ontem à noite tiveste problemas para a encontrar.

– O quê? Ah… sim. Obrigada, estava um pouco…

– Bêbada? – sugeriu Melanie.

Jade riu-se. Se podia contar com alguma coisa em sua própria casa, era com uma má opinião dela. Ninguém teria pena dela, nem a entenderia. De que lhe serviria contar a Melanie que tinha os olhos cheios de lágrimas na noite anterior e que por isso saíra do caminho? Ou que, traumatizada com a terrível experiência que sofrera, deixara o carro ao lado da fonte e tomara demasiados comprimidos para dormir, tantos que perdera os sentidos?

– Vais ficar para jantar esta noite? – perguntou-lhe a governanta.

– Se não te importares – disse Jade, que tinha a esperança de poder convencer Nathan a acompanhá-la a casa no dia seguinte, para ver se Roberto e os seus amigos continuavam lá. Os irmãos mais velhos tinham de servir para alguma coisa, até os que desprezavam a irmã.

– Amanhã tenho o dia livre. Terás de te desenvencilhar ou pedir a Ava que cozinhe alguma coisa.

– Isso não. A tia cozinha ainda pior do que pinta. Eu faço alguma coisa. Na verdade, onde está ela? Onde está toda a gente?

Os olhos pretos da governanta brilharam antes de se virar novamente para a máquina de lavar louça. O relógio do forno marcava duas horas e cinquenta minutos. Os comprimidos tinham-na deixado fora de combate durante quase doze horas.

– Nathan não está, se estavas à procura dele – informou-a Melanie. – Levou Kirsty e Gemma para a casa de praia, em Avoca, para o fim-de-semana.

– Gemma? – o nome soava-lhe familiar, mas não se lembrava de quem era. – Quem é Gemma? – perguntou, ignorando o facto de Melanie ter dado por garantido que queria ver Nathan.

– A rapariga que cuida de Kirsty. Kirsty está a viver aqui durante uma temporada.

– Sim? Mas como? Lenore finalmente encontrou um amante?

Jade suspeitava que, depois de doze anos de casamento com Nathan, para Lenore, seria difícil substituir o seu marido por outro homem. Pelo que soubera, o seu irmão era um fenómeno na cama.

– Não faço ideia de como está a vida privada de Lenore – repreendeu-a Melanie friamente. – Acho que estava farta do comportamento de Kirsty e pensou que seria bom que passasse algumas semanas com o pai. Mas como Nathan trabalha até tarde todos os dias, contratou alguém para cuidar de Kirsty antes e depois da escola.

– Tenho a certeza de que Kirsty está encantada com a ideia de ter uma ama com catorze anos – de repente, lembrou-se de quem era a rapariga. – A tal Gemma não é uma jovem exuberante com uns grandes olhos castanhos?

Melanie olhou para ela surpreendida, confirmando a intuição de Jade.

– Encontrei-me com ela há algumas semanas – explicou-lhe Jade. – Nathan estava no carro com a mencionada ninfa e fez uma boa imitação de pai protector. Suponho que ela esteja a viver aqui.

Melanie assentiu e Jade imitou-a. Muito devagar. Com cinismo.

– Aposto o que quiseres que já não é tão inocente como quando chegou, há algumas semanas.

– Eu não estaria assim tão certa – replicou Melanie. – Gemma é uma jovem que sabe muito bem o que quer e tem muito carácter.

– E vai precisar dele – murmurou Jade, surpreendida por Melanie confiar no empenho da rapariga.

Apesar de ser uma pessoa inexpressiva, Melanie não deixava de ser uma mulher. Não era possível que ignorasse o magnetismo de Nathan.

– Fala-me dela – continuou Jade, curiosa. – Onde é que Nathan conheceu semelhante jóia?

– Estás muito curiosa…

Jade riu-se, a governanta tinha razão. Talvez os seus sentimentos por Nathan não tivessem desaparecido completamente, como ela achara.

– Está bem, está bem. Pareço uma gata ciumenta. De onde é a rapariga?

– De Lightning Ridge.

– Do sítio das minas de opalas?

– Sim. Nathan foi comprar opalas para Byron e Gemma vendeu-lhe algumas. Parece que o seu pai acabava de morrer acidentalmente, caiu num poço, e Gemma estava a vender tudo o que tinha para vir para Sidney. Nathan disse-lhe que o procurasse se precisasse de emprego.

– E ela fê-lo, é claro. Que rapariga não o faria? Não me contes mais, eu imagino o resto.

A governanta suspirou exasperada.

– Suspira o que quiseres, Melanie, mas vi como a rapariga olhava para Nathan. Vais dizer-me que não está loucamente apaixonada pelo nosso Casanova particular?

– A única coisa que digo é que não é tola.

– Quer dizer que eu sou?

– Não ponhas na minha boca coisas que eu não disse, Jade. Só te conheço há dois anos, e há seis meses que não vives nesta casa e, quando vivias aqui, também não te via muitas vezes.

– Não preciso de viver aqui para que conheças todos os meus defeitos. A minha mãe adorava contar a toda a gente como eu era má. E é verdade. Saltava pelas janelas de madrugada para me encontrar com rapazes com apenas quinze anos. É tudo verdade! Não duvides.

– Tu e eu sabemos que não és tão má como pretendes, Jade – disse Melanie, surpreendendo-a com as suas palavras. – A tua rebeldia era uma vingança contra os teus pais, pela sua suposta falta de amor por ti, e por outras transgressões, também imaginadas, ou até reais.

– Meu Deus. Quem és tu? A psicanalista da casa?

– Tenho bastante experiência com a psicanálise.

Jade deixou de se sentir zangada e sentiu pena por aquela mulher triste. Conhecia o passado de Melanie, sabia que o seu marido e o seu filho tinham falecido num acidente de carro, à frente dos seus próprios olhos. Fora uma tragédia horrível.

No entanto, acontecera há muitos anos. E já estava na hora de Melanie começar a viver novamente. Ou isso, ou que se atirasse de um precipício ou algo do género.

Embora Jade soubesse que ela mesma nunca seria capaz de se suicidar. A vida era para ser vivida e ela pretendia viver a sua. Para o diabo com o seu pai, com Nathan e com o que acontecera na noite anterior. E ao diabo com a sua mãe. De qualquer modo, Irene devia estar no inferno.

– Estás bem, Jade? – perguntou-lhe Melanie.

– Sim, claro – pestanejou rapidamente e pensou em quando o seu cabelo era comprido e castanho. Depois de Nathan a ter rejeitado, cortara-o e pintara-o de loiro. Estranhamente, a mudança ficara-lhe bem. Os homens sentiam-se ainda mais atraídos por ela. – Estou bem – mentiu alegremente.

– Pois não parece. Estás com um aspecto horrível.

– Ah, é por causa dos comprimidos para dormir que tomei ontem à noite. Deixam-me atordoada.

– Não devias tomar comprimidos para dormir – reprovou Melanie muito séria.

Jade observou a governanta e perguntou-se se alguma vez teria sofrido uma overdose de comprimidos para dormir. De repente, sentiu a necessidade de tentar ser amiga daquela mulher por quem sempre sentira pena mas que, na verdade, de quem nunca gostara. Naquele momento, queria ser sua amiga, ver se podia ajudá-la. Mas não sabia o que dizer, nem como começar.

– Prefiro que não falemos de coisas desagradáveis – disse Jade alegremente. – Como vão as coisas com a tia Ava? Suponho que está no escritório, a sonhar com o seu príncipe encantado montado num cavalo branco. Já acabou alguma das suas intermináveis aguarelas?

– Pensava que a primeira pessoa por quem te preocuparias seria o teu pai, Jade, não a tua tia.

– Disse que prefiro não falar de coisas desagradáveis, lembras-te? Com um pouco de sorte, o papá continuará no hospital mais alguns dias. É bastante divertido vê-lo prostrado naquela cama branca, com a perna engessada. Mas já não o vejo há mais de quinze dias. Tivemos uma discussão horrível a respeito do meu aspecto. O que fez ultimamente? Voltou a partir a perna a tentar seduzir uma das enfermeiras? Certamente não o tentou com a chefe das enfermeiras, é uma fera!

Melanie sorriu, o que surpreendeu Jade. Era uma mulher bonita quando sorria, tinha os dentes muito brancos e os seus olhos brilhavam como jóias. Além disso, era muito sensual.

Jade ficou petrificada. Melanie… Sexy? Era uma ideia ridícula, mas…

Jade observou a governanta, tirou-lhe mentalmente aquele vestido preto, e tentou ver a mulher que havia atrás daquela fachada inexpressiva. Tinha os ombros magros mas largos, os seios generosos e a cintura e as ancas esbeltas. E quando se baixou para a máquina de lavar louça, Jade apercebeu-se de que tinha os glúteos bem formados, firmes. Tinha os joelhos bonitos. E os tornozelos, cobertos por umas horríveis meias bege, deixavam adivinhar umas pernas também esbeltas.

Jade tentou imaginar Melanie com um provocador vestido preto, os lábios pintados e uns brincos. Todos se surpreenderiam em Belleview, incluindo o seu pai, que não reconheceria a sua governanta, sempre tão correcta e formal.

Então recordou algo que fez com que o seu coração encolhesse. Talvez fosse melhor que Melanie ficasse como estava, tendo em conta o que acontecera entre a anterior governanta e o senhor de Belleview. Jade sentira-se horrorizada ao surpreender o seu pai com aquela mulher entre os seus braços. O seu pai, que tinha num pedestal, que passava o dia a pregar a respeito da moral, o autocontrolo e a boa reputação. O seu pai, a ter uma aventura com a governanta, enquanto a sua esposa, maníaco-depressiva, estava internada num sanatório.

Byron tentara explicar-lhe tudo, dizendo-lhe que apenas beijara a mulher num momento de fraqueza. Jade ficara imóvel, sem ouvir, sem querer entender, incapaz de perdoar, fossem quais fossem as circunstâncias.

Naquela época, tinha vinte anos. O seu pai despedira a desafortunada mulher, outra injustiça aos olhos de Jade, e contratara Melanie. Mas ela nunca conseguira olhar para o seu pai do mesmo modo outra vez. Continuara a crescer sozinha, com o seu próprio código de honra, tentando não magoar ninguém, como o seu pai fizera. E como Nathan também fazia.

Jade franziu o sobrolho ao pensar na sua mãe.

«Não», decidiu de repente. «Não vou inventar desculpas. Para nenhum deles. Para nenhum!»

Ouviu uns estranhos golpes provenientes de algum lugar da casa. Jade virou-se e viu o seu pai a avançar pela sala, com uma muleta na mão direita.

Os seus olhos encontraram-se através da porta, os de Jade abriram-se mais e os de Byron semicerraram-se. Parecia muito zangado.

– Não tive oportunidade de te dizer – disse Melanie em voz baixa. – O teu pai saiu ontem do hospital.

Capítulo 2

 

– Parece que mudaste de ideias a respeito de voltar a dormir nesta casa – bramou Byron, dirigindo-se à sua filha.

– Olá para ti também, papá – respondeu ela. Como era possível que o seu pai já tivesse saído do hospital? Quinze dias antes, tinham dito que a sua perna não estava a recuperar bem e que teria de ficar mais um mês. Devia ter imaginado que o seu pai demonstraria que os médicos se enganavam. – Vais tentar ficar com o papel de Long John Silver? – brincou, assinalando a muleta.

– Um dia, usarás essa tua língua atrevida com a pessoa errada. Espero estar por perto para o ver. Melanie, estou à espera de uma visita. O senhor Armstrong. Leva-o ao meu escritório quando chegar. E vamos beber café. Ou chá, se ele preferir. Pergunta-lhe.

– É claro, Byron. O senhor Armstrong ficará para jantar?

– Talvez sim, talvez não. Depois digo-te.

– E quem é o senhor Armstrong? – quis saber Jade.

– Não o conheces – respondeu Byron, olhando para a sua filha de cima a baixo. – Que rapariga. Nunca usas sutiã? – perguntou. Depois virou-se e saiu a coxear.

Ela fez uma careta. Claro que usava sutiã… uma vez a cada cem anos, mais ou menos.

Tinha de admitir que a t-shirt cor-de-rosa que usava se colava ao peito como uma segunda pele, marcando-lhe os mamilos. Mas não trouxera roupa e no armário só havia roupas que há anos não vestia e que ficavam demasiado apertadas, recordação de uma época de semi-anorexia. Emagrecera tanto, que perdera metade dos seios. Horrorizada, recomeçara a comer até recuperar o seu peso e substituíra a dieta por exercícios de aeróbica, ficando com uma figura óptima. Orgulhava-se disso e não tinha intenção de esconder o seu corpo, que tanto esforço lhe custara, debaixo de um monte de roupa aborrecida. Tinha apenas vinte e dois anos!

Saiu do banco da cozinha e apercebeu-se de que as calças de ganga que vestia eram quase obscenas, de tão apertadas. Talvez devesse pedir alguma roupa à tia Ava.

Jade estava a atravessar a sala, em direcção à entrada, quando bateram à porta.

– Eu abro, Melanie! – gritou. – Deve ser o misterioso senhor Armstrong.

– Pergunta-lhe se vai ficar para jantar, por favor – pediu-lhe Melanie. – E se quer chá ou café.

– Está bem.

Jade estava a assobiar quando abriu a porta, mas desceu o tom do assobio ao ver o homem que esperava lá fora. Era muito bonito! Alto, mas não demasiado, com o cabelo preto e encaracolado, a pele azeitonada, as feições magras, taciturnas, e uns penetrantes olhos pretos. Tinha umas pestanas espessas, negras, e também muito frisadas.

Parecia esculpido em pedra. E não parecia ter-se alterado minimamente com o seu assobio.

Jade achou ver uma pequena reacção quando percorreu o seu atractivo corpo com o olhar. Porém, se ficou impressionado com o que viu, não o demonstrou. Levantou ligeiramente o sobrolho e disse num tom completamente inexpressivo:

– Boa tarde. O senhor Whitmore está à minha espera. Sou Kyle Armstrong.

«Pergunto-me se haverá uma senhora Armstrong», foi o primeiro pensamento de Jade, apesar de o homem parecer indiferente aos seus encantos. Não havia nada como um bom desafio. Seria bom mudar, contudo, nunca andava com homens casados.